August 17, 2023 3:04 pm EDT

Andrea Ciolette Baes, diretora de Saúde Feminina da Organon Brasil

No Brasil, duas em cada três mulheres gestantes (66%) não haviam planejado a gravidez em 2021, de acordo com a Pesquisa Nacional de Aborto.¹ E diversos são os fatores apontados para explicar essa realidade. Segundo o Fundo da População da ONU no Brasil (UNFPA), estão entre as principais razões o baixo acesso a métodos contraceptivos seguros e modernos — com apenas 58% das brasileiras usando-os continuamente, como mostra um levantamento feito pelo Instituto Ipsos a pedido da Organon — e a incapacidade de recusar relações sexuais, seja por questões culturais ou por diferentes graus de violência.²

Esses dados não apenas colocam em evidência uma realidade preocupante, mas também levantam outro aspecto crucial: a relação entre as emoções e a saúde física. Gerar uma vida é sempre um grande desafio. São diversas as mudanças, não apenas no corpo e no emocional da mulher, mas em toda a estrutura familiar. Em muitos casos, elas não contam com uma boa rede de apoio e sequer têm acesso à saúde de qualidade. Segundo pesquisa de maio de 2023 do Datafolha, metade das mães brasileiras são solo. Entre elas, 18% estão desempregadas e 44% sobrevivem com até R$ 1.212 por mês.³ 

No que tange à saúde física, a falta de planejamento reprodutivo para evitar a gravidez indesejada está entre os fatores que agravam a situação da mortalidade materna no Brasil, que alcançou o índice de 117,4 mortes a cada 100 mil nascidos vivos no em 2021, de acordo com levantamento do Ministério da Saúde.⁴  Em comparação, nos Estados Unidos, essa correlação foi de 32,9 no mesmo período.⁵ 

Por outro lado, a Associação Brasileira de Medicina Psicossomática (ABMP) enfatiza a ligação entre traumas, negativismo, pressão ou violência psicológica e seus impactos sobre o corpo.⁶ Em todo o mundo, os problemas de saúde mental materna são considerados um grande desafio para saúde pública e, apesar disso, o tema ainda é pouco abordado, tanto na atenção ao pré-natal, como no pós-parto.

Segundo o Ministério da Saúde, a gravidez não planejada está entre os diversos fatores de risco que podem contribuir para o desenvolvimento de questões relacionadas à saúde mental, assim como o histórico familiar de doença mental, baixo apoio social, socioeconômico, entre outros.⁷ 

A pesquisa “Nascer no Brasil”, realizada entre 2011 e 2012 pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP-Fiocruz), foi a primeira a abordar, em âmbito nacional, a ocorrência de sintomas depressivos entre as mulheres que haviam recentemente dado à luz no país. O estudo realizado com 24 mil participantes revelou que a prevalência de possíveis casos de depressão foi calculada em 26% — ou seja, uma em cada quatro mulheres apresentava indícios de depressão pós-parto.⁸ 

Segundo a ENSP/Fiocruz, aproximadamente 10% das mulheres durante a gravidez e 13% no período pós-parto enfrentam algum tipo de questão relacionada à saúde mental, predominantemente depressão, embora outras questões como ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático, psicose pós-parto, transtorno de pânico e fobias também sejam relatados.⁹ E aqui estamos falando de estudos gerais. Não sabemos ao certo quantas dessas mulheres foram surpreendidas com uma gravidez não planejada, o que tem potencial para agravar o quadro.  

Neste cenário, se faz ainda mais necessária a discussão de medidas e políticas públicas para incluir o acompanhamento da saúde mental na rotina de cuidado com a gestante. Tão ou mais importante que isso, precisamos avançar em medidas para que mulheres e pessoas com útero tenham acesso ao planejamento reprodutivo como também à informação, segurança e saúde. E, claro, a métodos contraceptivos modernos, de qualidade e que atendam às necessidades de cada uma delas. Mulheres saudáveis física e mentalmente, com autonomia de seus próprios corpos, são essenciais para uma sociedade mais forte, igualitária e digna para todos. 

Referências

1. https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2023-03/uma-em-cada-sete-mulheres-aos-40-anos-ja-passou-por-aborto-no-brasil
2. https://brazil.unfpa.org/pt-br/news/swop2022
3. https://www.brasildefato.com.br/2023/05/14/datafolha-metade-das-maes-brasileiras-sao-solo-e-69-das-mulheres-no-pais-tem-ao-menos-1-filho
4. https://www.gov.br/ebserh/pt-br/hospitais-universitarios/regiao-nordeste/hulw-ufpb/comunicacao/noticias/no-mes-alusivo-a-reducao-da-mortalidade-materna-hulw-intensifica-acoes-de-capacitacao-sobre-o-tema
5. https://revistacrescer.globo.com/fique-por-dentro/noticia/2023/03/mortalidade-materna-nos-eua-atinge-o-nivel-mais-alto-desde-1965.ghtml
6. https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/07/01/doencas-psicossomaticas-saiba-como-emocoes-e-pensamentos-afetam-o-corpo.htm
7. https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/saude-mental-feminina-cuidados-redobrados-no-perinatal-e-no-climaterio-1
8. https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/principais-questoes-saude-mental-perinatal/#:~:text=A%20depress%C3%A3o%20%C3%A9%20mais%20frequente,homens%20tamb%C3%A9m%20podem%20ser%20afetados.
9. https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/principais-questoes-saude-mental-perinatal/#:~:text=A%20depress%C3%A3o%20%C3%A9%20mais%20frequente,homens%20tamb%C3%A9m%20podem%20ser%20afetados.